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Parte da minha investigação sobre as imagens, e a sua possibilidade de serem tratadas através do desenho e da pintura, debruça-se sobre o universo vegetal e animal. As plantas, flores e pássaros constituem um tema geral que me permite trabalhar a linha na sua complexidade de configurações. O universo vegetal e animal permite-me fazer a ligação entre as minhas memórias de infância passada na aldeia dos meus avós paternos, o trabalho dos pintores franceses do final do século XIX e a minha fruição quotidiana a partir da minha varanda com vista para o jardim e das plantas que tenho no atelier. Num universo aceleradamente digital e tecnológico, interessa-me manter uma relação com o natural como forma de encontrar uma harmonia primordial como ato de resistência e sobrevivência.
A proposta expositiva para o átrio do Espaço Amoreiras é uma invasão do natural, que procura o contraste entre o funcionalismo do edifício e as linhas ondulantes das plantas e animais. Este conjunto de trabalhos em desenho e pintura organizou-se numa composição dinâmica pelo espaço, convidando o observador a um percurso por entre as obras instaladas.
Jorge Leal,2016
Na Senda do Dis-curso Desenhado
O Relato do Traço
“[…] Como se, no momento de desenhar, eu não visse mais a coisa”.
(Jacques Derrida)
Tudo parece acontecer neste espaço induzido onde o compromisso com o desenho nos retém entre o ver e o tido. Lugar vertido pelo tecer do movimento onde o encontro se fixa entre a conexa acção da mão e o território-papel. Gesto fecundante, ritmo impregnante que circula e transita pelos diversos tipos de papel, numa espécie de comunicação-irrigação que faz fluir o engendrar da mão no exercício orientado dos dedos, dos braços, e do corpo inteiro. Neste fluxo que institui e instiga a espontânea expressão da existência e do criar, consagra-se o dis-curso do espesso traço a pincel – diluído no mover das águas – configurado pela tinta-da-china sobre papel.
Vasto e denso traço que se faz leve no elevar do pássaro, como se de um voo se tratasse, tal é o viajar nas asas do tempo-pássaro percorrendo e recriando em voo raso, fragmentos do mundo natural e animal – revelando a matéria e o orgânico. Neste movimento do imaginário criativo regressa à superfície o tempo-pássaro que re-pousa sobre o ramo ou sobre o dedo, num acto de demora como o voluptuoso acoplar. Contacto e puro prazer. Consolo e pulsão. Vulcão e explosão. Rebentamento que dilata e extasia o olho (a pupila) a-tingindo a superfície nua onde verte o líquido e a seiva que marca o traço alinhado e entrelaçado que se mantém sem fim, desdobrado e suportado pelo olhar-táctil.
Silvestre Santos, 2016